Por Eraldo Paulino, comunicador voluntário, e Alan Sampaio, comunicador da Cáritas Diocesana de Crateús

A XX Feira da Agricultura Familiar e Economia Popular Solidária dos territórios Inhamuns e Crateús, com tema “Agricultura Familiar e Ecologia Integral: Segurança Alimentar e Bem Viver no Semiárido”, realizada no município de Crateús, nos dias 05 e 06 de junho, é considera a culminância de processos que revolucionam a forma como o povo sertanejo se relaciona com a caatinga, com a economia e um outro mundo possível, tendo em suas bases a intensa atuação das pastorais sociais desde a fundação da Diocese de Crateús, em 1964.

“Depois da Constituição de 88, lá nos anos 90, os movimentos e as pastorais sociais começaram a entender que nós aqui no Semiárido nós somos um povo que temos muitas possibilidades, que a gente não precisava migrar para construir um bem viver”, argumenta Adriano Leitão, coordenador da Cáritas Diocesana de Crateús, uma das realizadoras do evento. Segundo ele, a partir do momento que as comunidades lutaram e conquistaram a mudança de paradigma na política, não mais de “combate à seca”, mas de convivência com o Semiárido, várias revoluções passaram a acontecer.

Uma delas foi a possibilidade de, com o auxílio das tecnologias de convivência com o Semiárido, ser possível produzir no campo, mesmo em tempos de estiagem. Prova disso é que a vigésima edição da Feira ocorre com apenas uma interrupção, que ocorreu por conta da Pandemia de Covid 19 em 2020, e não por falta de produtos. “Nós vivemos na região seis anos de estiagem, de 2012 a 2017. Em outras décadas isso significaria alto índice migratório, morte de muitas pessoas e de animais. Ainda houve migração e morte de animais, mas bem pouca, em relação ao que tínhamos. E não houve morte de pessoas por inanição ou falta d’água”, pontua Kryssia Melo, assessora técnica da Ematerce.

A Feira Regional, portanto, foi um anseio das organizações do campo e da cidade, tendo as agricultoras, os agricultores, lideranças sindicais e de movimentos sociais como protagonistas da construção do evento, que desde o início se deu como uma ciranda de possibilidades criadas a partir da cooperação, do voluntariado, tendo como pilares do evento a formação, a cultura e a comercialização solidária.

“Antigamente o produtor ia com o milho e o feijão para as feiras, os armazéns, e perguntavam quanto eles queriam pagar por aquilo. Vivia submisso aos atravessadores. A feira regional e as feiras municipais da agricultura familiar eram um sonho nosso, para que a gente pudesse dizer o quanto o nosso produto vale, porque nós sabemos o trabalho que dá”, recorda Maria de Jesus, agricultora familiar que ajudou a articular as primeiras feiras municipais em Crateús, e estava à frente de um dos 40 empreendimentos oriundos de cinco municípios, que estavam na Primeira Feira da Agricultura Familiar e Economia Popular Solidária dos Sertões dos Inhamuns e Crateús, que ocorrera no lardo da praça da Matriz de Crateús.

A vigésima edição contou com records de empreendimentos (235) e de participação feminina (80%), oriundos de 33 municípios de 9 regiões cearenses. Cerca de 25 mil pessoas compareceram nos dois dias de comercialização, embora a programação de formação tenha sido maior. Foram 14 atividades realizadas em quatro dias (de 03 a 06 de junho). Estima-se que a Feira gere cerca de R$ 600 mil para Crateús, lotando a capacidade da rede hoteleira, com mais de 200 voluntárias e voluntários tornando esse sonho possível.

CULTURA

Desde a primeira edição, o palco da cultura é um dos destaques da feira. Para Raimundo Clarinto, cantor, compositor, poeta e agente Cáritas, a feira em si já é cultura. “Se a gente pensar que os agricultores, a maioria do campo se encontram na praça com clientes, a maioria da cidade, a gente já tem ali um grande encontro, uma grande diversidade de vozes. O palco, a arte da feira só reflete essa diversidade. Pelo palco passam tanto cordelistas, como bandas forró pé-de-serra, como também passam bandas de rock, orquestras, numa ótima representação do melhor que nós temos não só na nossa região, mas também no Brasil, porque essa feira não é mais um evento só regional. Ela é uma das mais importantes do Brasil”, detalha Clarindo.

FORMAÇÃO

Como ocorre também desde a primeira edição, oficinas, encontros formativos diversos são ofertados para feirantes e público em geral. Mas desde 2012, intercâmbios também fazem parte dessa colcha de retalhos, envolvendo outros municípios da região. Na vigésima edição, foram realizados:

Dia 03 de junho – V Encontro com as rezadeiras, benzedeiras, terapeutas comunitárias/os e agentes da pastoral da Saúde, com Instituto Bem Viver.

Dia 04: Seminário “Caminhos da Inclusão e Certificação da Produção Familiar”; Oficina de rotulagem de produtos da agricultura familiar.

Dia 05: Oficina na comunidade Lagoa Grande, em Crateús, de sistemas integrados para produção de forragem; Seminário VRC Núcleo de Crateús e Um Grito pela Vida; Encontro de Conjuntura da Pesca Artesanal na Região dos Açudes – Com Articulação dos Pescadores e Pescadoras dos Açudes (APPAA); Seminário “Integração das Políticas e Projetos da SDA”; Seminário “Os impactos dos agrotóxicos na vida humana e ambiental”; Oficina “Fundo Rotativo Solidário para Grupos Produtivos”, com Cáritas Brasileira Regional Ceará; Oficina de sanduíche natural, com Sincredi;

Dia 06: Intercâmbio “Projeto Alimento no Semiárido”, com Escola Família Agrícola Dom Fragoso e We World; Oficina de produção de iogurte natural grego; Oficina sobre educação financeira, com Sincredi; Encontro “Metodologias de Assessorias, com Cáritas Brasileira Regional Ceará.

REALIZAÇÃO E PATROCÍNIO

A Feira da Agricultura Familiar e Economia Popular Solidária dos Territórios de Inhamuns e Crateús é resultado do esforço conjunto de diversas mãos. Além dos produtores e produtoras, gostaríamos de expressar nossa profunda gratidão aos nossos parceiros: IFCE Campus Crateús, EMATERCE, FETRAECE, Secretaria de Desenvolvimento Agrário e Pecuário de Crateús e do Governo do Estado do Ceará (SDA). Destacamos, especialmente, o fundamental patrocínio do Banco do Nordeste e o apoio do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), parceiros estratégicos da agricultura familiar, no Governo Federal. Essas colaborações demonstram o compromisso essencial para o sucesso da XX Feira e para o desenvolvimento do território.